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O plano radical de Berlim para conter os aluguéis astronômicos.

Postado por Casa Antiga em 3 de abril de 2019
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Um ex-prefeito de Berlim se referiu certa vez à capital alemã como “pobre, mas sexy” – um slogan que refletia o custo de vida relativamente baixo da cidade.

Hoje em dia, porém, basta tentar alugar um apartamento ali para descobrir que a parte “pobre” dessa identidade está mudando rapidamente. Um afluxo de pessoas, como estudantes que procuram um destino de estudo mais barato e jovens profissionais atraídos pelo forte mercado de trabalho, ajudou a tornar Berlim um dos mercados imobiliários de maior crescimento no mundo e contribuiu para um rápido aumento nos preços dos aluguéis.

De acordo com um estudo recente do portal imobiliário Immowelt, os aluguéis mensais em Berlim mais do que dobraram nos últimos 10 anos: de 5,60 euros (R$ 24,20) por metro quadrado em 2008 para 11,40 euros em 2018 (R$ 49,26). Embora o valor ainda seja menor do que em outras grandes cidades alemãs, como Munique ou Frankfurt, o aumento foi de 103%, maior do que em qualquer outro lugar do país. Os preços dos aluguéis variam muito de acordo com o bairro, mas as estatísticas de 2017 mostram que um apartamento de um quarto em algumas das áreas mais cobiçadas da cidade pode sair por uma média de mil euros por mês.

As crescentes preocupações com o custo de vida não são exclusivas de Berlim, é claro; grandes cidades do mundo estão passando pela mesma situação. Mas um grupo de políticos locais propôs uma ideia radical para enfrentar o problema: introduzir um teto que congelaria todos os aluguéis pelos próximos cinco anos.

“Até seis ou sete anos atrás, Berlim tinha aluguéis muito menores”, diz à BBC Capital Julian Zado, vice-líder dos sociais-democratas de Berlim e um dos autores da proposta.

“Muitos jovens – como eu – vieram para Berlim porque os apartamentos custavam metade do que em Frankfurt ou Munique, por exemplo. Mas o que torna Berlim única frente a essas cidades é a rapidez com que esse cenário mudou.”

Na Alemanha, a política de habitação é, normalmente, definida em âmbito nacional. Mas depois que um advogado local defendeu ser legalmente possível que Estados implementassem seus próprios regulamentos de moradia, sociais-democratas de centro-esquerda de Berlim aproveitaram a oportunidade e propuseram determinar um Mietendeckel, ou “teto de aluguel”.

 

Objetivo do teto para aluguéis.

A ideia por trás da proposta é que, embora novas moradias estejam sendo construídas para atender ao aumento da demanda, vão demorar anos até que esses apartamentos estejam realmente disponíveis.

Ao congelar os aluguéis por cinco anos, Zado diz que a cidade poderia ajudar a evitar aumentos substanciais até que um influxo de novas residências estabilize o mercado. Idealmente, ele e seus colegas querem que essa medida – combinada com outras – reduza o valor médio para cerca de 6 a 7 euros (de R$ 25,92 a R$ 30,25) por metro quadrado (frente aos atuais 11,40 euros).

“Todos os anos, dezenas de milhares de pessoas se mudam para Berlim, porque é uma cidade muito atraente – e, como resultado, sabemos que o problema só se tornará mais evidente”, acrescenta.

Na última década, a população de Berlim cresceu exponencialmente: a cidade abriga atualmente mais de 3,7 milhões de pessoas, segundo estatísticas do governo, ante 3,4 milhões no final de 2008. As estimativas do Senado de Berlim dizem que esse crescimento deve continuar a todo vapor. Projeções indicam que a cidade vai ultrapassar a marca de 4 milhões de moradores em 2025.

Combine isso com o fato de que a grande maioria dos berlinenses – aproximadamente 85% – aluga suas casas ou apartamentos, em vez de possuí-los, e o futuro não parece ser muito promissor para moradias a preços acessíveis. Alguns desses apartamentos são do governo. Proprietários individuais e grandes empresas de locação controlam o restante.

Basta perguntar a qualquer jovem que more em Berlim e você vai ouvir uma odisseia na busca por um aluguel que caiba no bolso. Gabriella Linardi tem 26 anos e trabalha no setor de tecnologia. Ela se mudou para Berlim vinda dos Estados Unidos há dois anos e paga 300 euros por mês por seu quarto dentro de um apartamento que divide com outras pessoas. Seu noivo Max, um alemão de 29 anos que também trabalha no setor de tecnologia, vive há mais tempo na cidade e paga o mesmo do que Gabriella.

Os dois estão querendo morar juntos – mas apesar de estarem dispostos a gastar mais do que o que pagam hoje separadamente, ainda não conseguiram encontrar um novo apartamento. Decepcionados com os preços e as opções quando começaram a pesquisar, Linardi diz: “O que estamos procurando, mesmo que dobremos nosso orçamento, é basicamente um lugar não muito melhor do que estamos vivendo agora – e cada vez mais longe do centro.”

Nos útimos anos, a Alemanha tomou medidas para lidar com esse problema: em 2015, o Parlamento aprovou uma lei restringindo o quanto os proprietários podiam aumentar em seus aluguéis. Segundo essa legislação, o preço do aluguel de um novo contrato não pode superar em mais de 10% o preço médio do bairro onde está localizado.

Políticos e especialistas em política de habitação dizem que a lei, no entanto, não protege os inquilinos o suficiente. Reiner Wild, presidente da Associação dos Inquilinos de Berlim, diz à BBC Capital que há muitas brechas na legislação. Sem falar que os proprietários às vezes preferem ignorá-la. Além disso, os inquilinos muitas vezes não querem tomar medidas legais contra os proprietários, pois a busca por um apartamento está cada vez mais difícil.

“(A lei tem) ajudado inúmeros inquilinos, mas não teve um efeito sustentado nos níveis dos aluguéis”, diz Wild.

 

Quais são os riscos da medida?

A introdução de um teto de aluguel, ainda que temporária, poderia aliviar a pressão sobre aqueles que se esforçam para enfrentar o crescente custo de vida em Berlim, mas carregaria riscos significativos.

Tal política pode exacerbar a escassez de moradias existentes na cidade: alguns especialistas dizem que ela pode levar as incorporadoras a buscarem compradores, não inquilinos, para seus novos apartamentos.

“Há falta de moradia em Berlim”, diz Michael Voigtländer, do Instituto Econômico Alemão, em Colônia. “Mas essa falta de moradia não será resolvida se os aluguéis forem limitados.”

Axel Gedaschko, diretor da associação da Indústria de Habitação Alemã, disse ao jornal alemão Die Zeit que a lei poderia, inclusive, provocar uma crise habitacional nos próximos anos: “Um congelamento de aluguel levaria à construção de cerca de 50 mil apartamentos a menos nos próximos cinco anos”, disse ele.

Além disso, se os proprietários souberem que não podem aumentar seus aluguéis nos próximos cinco anos, poderão optar por adiar quaisquer reformas nesse meio tempo.

“Se os proprietários não tiverem um incentivo para reinvestir o dinheiro em sua propriedade porque os aluguéis estão congelados, pode haver uma redução na qualidade da moradia por falta de manutenção”, diz Corianne Scally, especialista em habitação acessível do Instituto Urbano dos EUA.

Ainda falta um longo caminho a percorrer para que o projeto saia do papel. Ainda não se sabe se, legalmente, Berlim pode implementar sua própria política de habitação. Na hipótese de a Justiça aprová-la, a proposta seria então discutida por políticos locais e outros especialistas que elaborariam uma lei. Cumprida essa etapa, não se sabe como ela funcionaria na prática.

Enquanto isso, alguns moradores de Berlim estão tentando manter os preços dos aluguéis baixos com outra estratégia: fizeram um abaixo-assinado pedindo que a cidade impeça o funcionamento de empresas de aluguel com mais de 3.000 apartamentos. (Uma delas, a Deutsche Wohnen, possui aproximadamente 115 mil em toda a cidade). Essa petição tem até o início de abril para coletar assinaturas suficientes, na esperança de fazer pressão sobre o governo.

Se tal política for implementada, os políticos locais dizem que seria algo revolucionário – e um exemplo a ser seguido para outras cidades que enfrentam problemas de custo de vida. Hamburgo também está começando a considerar a implementação de algum tipo de limite de aluguel.

“Essa ideia nunca existiu antes na Alemanha”, diz Katrin Schmidberger, vereadora do Partido Verde e porta-voz de seu partido sobre política habitacional. “Sobre a questão de saber se isso é possível ou não, estamos entrando em novo território legal e politicamente.”

 

Fonte: Época Negócios.

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